A reação do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), ao aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), anunciado pelo governo na semana passada, reforçou a urgência de uma reforma mais ampla no Orçamento e nas contas públicas, antes que a insustentabilidade do crescimento dos gastos inviabilize a atuação do governo, algo previsto para ocorrer em 2027.
Economistas descrevem uma situação crítica nas contas, mas são céticos em relação à disposição do Congresso e do governo para enfrentar o problema.
O quadro mais crítico era esperado para o primeiro ano do próximo mandato presidencial. O Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026 traz uma previsão de rombo de R$ 10,9 bilhões, só para cumprir os gastos mínimos, previstos na Constituição, com saúde e educação em 2027.
Com esse rombo, o Orçamento fica comprometido a ponto de não haver espaço para pagar programas como Farmácia Popular, manter as universidades públicas, emitir passaportes ou financiar pesquisas científicas.
A solução, segundo especialistas, seria uma reforma mais estrutural, que passaria por mudar os mecanismos de indexação — como o salário mínimo como referência para gastos da Previdência — e de vinculação — a obrigatoriedade de investir parcelas mínimas das receitas em determinadas áreas, como saúde e educação. E também mudanças na destinação de recursos para as emendas parlamentares.
São pontos considerados difíceis de mudar, seja porque mexem com interesses dos próprios parlamentares, como as emendas, seja porque são considerados impopulares — e, portanto, capazes de levar a reveses eleitorais —, como a política de reajuste do salário mínimo.
Para o economista Fabio Giambiagi, especialista em contas públicas e pesquisador do FGV Ibre, a política de reajuste do piso salarial é o maior problema. O uso do salário mínimo como piso dos benefícios da Previdência é algo que pode ser difícil de mudar, porque está na Constituição, mas a regra atual de aumentos anuais acima da inflação agravou o quadro recentemente:
Déficits crescentes
O piso salarial ficou congelado, corrigido apenas pela inflação, ao longo do governo de Michel Temer e de Jair Bolsonaro, de 2016 a 2022, com exceção de 2019, quando houve aumento real. A partir de 2023, Lula retomou os reajustes reais do piso salarial, de acordo com o crescimento do PIB de dois anos antes. Agora, esses reajustes estão limitados ao crescimento das despesas que varia de 0,6% a 2,5%.
O problema é que o salário mínimo é o piso dos benefícios da Previdência, maior rubrica das despesas públicas, com gasto anual acima de R$ 1 trilhão. O crescimento tem surpreendido para cima recorrentemente desde 2021, o que turbinou o avanço dos gastos de 2023 para cá. Na visão de Giambiagi, a volta dos reajustes reais é a principal causa do agravamento do desequilíbrio orçamentário.